terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Cancelar 2020?

 

    De todos os desejos, vontades e sonhos que ouvimos das pessoas neste fim de 2020, a frase que mais se destaca é: "Cancele 2020" ou "Acabe, 2020!"... 

    Mas será que precisamos cancelar ou até mesmo esquecer tal ano? 

    Incontestavelmente foi um período duro, complicado e triste para muitos. Todos sentimos, de alguma forma, as consequências de um ano desastroso. Mas cancelar um tempo vivido não é assim tão fácil nem necessário, afinal, experiências, por mais dolorosas que sejam, podem nos fazer crescer se, de fato, quisermos. 

    

    O que devem, de forma urgente, ser canceladas ou destruídas são outras tantas coisas. 

    Ao mudar o último algarismo do ano em curso, temos uma oportunidade para começar de uma forma diferente, aliás, cada vez que o sol se põe no horizonte, ele anuncia uma nova chance de mudança, que virá com seu nascimento.

Se for para acabar, que seja a desesperança, que não nos permite dar o próximo passo. 

    Que cancelemos a hipocrisia, pois ela nos mostra um ser humano de aparências, sem autenticidade, sem verdade naquilo que diz e faz; cria um abismo entre o que nos é mostrado numa tela com o que se é, de fato. 

    Que se acabem os interesses que nos aproximam uns dos outros, mas permitem que a distância seja absurdamente visível na convivência, na forma de agir, nas atitudes nada acolhedoras. 

    

    Que sejam canceladas algumas formas de vivenciar a fé, a devoção, a crença, pois algumas delas nos afastam do que é humano numa tentativa de nos aproximar de um "divino" que não abraça nem se compadece do outro. 

    Que se acabem os discursos cheios do nome de "Deus", mas vazios de amor, revelando-nos uma outra face: a do preconceito, do egoísmo, do desafeto, da separação.

    Que sejam cancelados os abusos de autoridade, os falsos líderes e profetas que, em vez de criar laços, erguem muros, propagam mentiras, exaltam as armas, disseminam ódio... 

    Canceladas sejam as máscaras, aquelas que ficam por detrás das de tecido, pois o que conta é a verdadeira face, com todos os traços, com todas as marcas criadas pelo tempo e pelas experiências. 

   

    Cancele o coração cheio de mágoas e se abra ao perdão como, efetivamente, deve ser! Que se acabe o medo de pronunciar as frases "Eu errei", "Eu te perdoo", "Eu te amo"...

    Há muito o que cancelar, bem mais que fingir que o ano de 2020 não tenha existido! 

    Cancelemos o que, de fato, é necessário. Só assim poderemos viver algo novo a partir da virada do ano e do nascer do sol...

 

Imagem: https://pixabay.com/pt/illustrations/cancelado-pare-atividade-vazio-4896470/

sábado, 1 de agosto de 2020

A singeleza do telhado

É evidente a segurança e são grandes as vantagens em morar numa casa com laje ou forro, seja de qualquer espécie, mas não se pode negar e deixar de falar da nobreza que é poder experienciar a vida debaixo de um teto feito com telhas, principalmente à moda antiga, com portas e janelas das mais simples.
É claro que, em algumas situações, os problemas são inevitáveis. E como são!
Você já passou pela experiência de, no meio da madrugada, durante o seu melhor momento de sono, sentir algumas gotas frias vindas do teto? Já teve que se levantar altas horas da noite para pegar um balde ou uma bacia e colocar debaixo de uma goteira, a fim de que não molhasse mais o piso, o chão da casa? Enfrentou uma chuva de granizo forte, escutando o barulho de cada pedra de gelo batendo nas telhas? Se a sua resposta for não, repito o que costumamos dizer: "nem te conto!" 
Tudo isso é a parte ruim. Vamos para a outra...
Da mesma forma que o buraco de uma telha pode fazer gotejar, ele também deixa passar os raios do sol, que reluzem no chão da casa. Dá para saber a hora exata, observando, a cada dia, a troca de lugar de sua marca. Na falta de um relógio, por quê não?
Acordar acompanhando o clarear do dia é, também, uma das gostosas sensações que nos brinda o telhado. E aí a gente vê o brilho do amanhecer entrando pelas suas frestas.
O cheiro do café que acabou de ser passado no coador feito de pano, costurado, muitas vezes, pela própria mãe - e por isso, a ela serei eternamente grato -, que chega aos quartos, passando pelas áreas que ficam entre o fim da parede e o telhado. E junto com o aroma do café, o cheiro da madeira queimada no fogão à lenha. 
E, se uma tempestade pode causar danos devido à fragilidade do telhado, a chuva mansa soa como uma canção de ninar. Dá para ficar horas observando-a cair sobre as plantações, sentados ao pé da porta, na varanda, ou aproveitar a oportunidade única  de poder desfrutar de um sono bem gostoso, embalado pela melodia dos chuviscos...
E assim Deus vai nos moldando e escreve a nossa história! Uma estrutura pode ser firme, construída com a mais alta tecnologia, mas são as coisas mais simples que nos farão experimentar a grandeza do Criador!




sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Quando mudamos...



Mudamos quando olhamos à nossa volta e somos capazes de optar por outros trilhos que não os usuais.
Mudamos quando percebemos que a vida alheia é, de fato, do outro, e sua particularidade não nos interessa.
Mudamos ao entender que as crises são necessárias para o nosso crescimento. E como crescemos a partir delas!
Mudamos quando compreendemos que o valor das pessoas não habita na função exercida ou no cargo que ocupa, mas sim na maneira como é capaz de gerir tudo isso.
Mudamos ao abrir os olhos para o mundo e perceber que há múltiplas formas de crença, e o importante é o respeito diante do que nos é diferente.
Mudamos quando valorizamos o tradicional, mas damos espaço e boas-vindas ao que é novo.
Mudamos ao olhar para o ser humano e percebermos que ele é dinâmico, muito além daquilo que nos enquadra num mundo tão fechado e cheio de regras escravizantes.
Mudamos quando somos capazes de fazer escolhas por nós mesmos e não para satisfazer a outros.
Mudamos quando permitimos, quando queremos viver de forma intensa.
Mudamos...




Imagem: Imagem: https://cdn.pixabay.com/photo/2018/04/11/08/59/rails-3309912_960_720.jpg

quarta-feira, 5 de julho de 2017

Fale-me de você

(Sugiro que ouça, durante a leitura, o som que está no vídeo ao fim do texto. Faça uma leitura lenta)

Fale-me de você!
Vamos, diga-me algo sobre você. É preciso que isso aconteça: que pare um pouco e fale-me a seu respeito.
Conte-me como anda sua vida, suas sensações.
Não. Não quero saber sobre o valor que pagou pelo ingresso naquele evento. Nem mesmo me interessa discursar a respeito da cor que deveriam ter pintado o prédio da esquina. Também não nos distraia falando sobre futebol, cozinha, política, religião...
Quero ouvir sobre você.
Vamos juntos sentar naquele banco, ao som do movimento da vida, encarando-nos mutuamente, sem deixar que os olhos passeiem por sobre os ombros ou que, por um descuido, a nossa atenção se perca.
Quero ouvir sobre sua vida, das coisas que te fazem bem, das que te completam. Conte-me se o seu sentimento é de satisfação ou tristeza. O que me importa não são os motivos e sim a sua verdade, a pureza ao me falar de você.
Permita-me escutá-lo e permita-se confiar em mim. Diga-me se conquistou o que andava buscando. Se não, também não importa. O que conta é a lição que tirou de tudo aquilo que tenha vivenciado. Até porque corremos o risco de aprender mais com as derrotas que com as vitórias.

Fale-me de você. Pare. É necessário que deixe um pouco de lado as outras coisas e converse comigo. Por que a pressa? É e será sempre assim? Até quando? Não olhe para o relógio. Ele não importa agora. Olhe em meus olhos e me conte. Pode ser por meio do silêncio. Às vezes ele fala mais que muitas palavras.
O mundo anda tão cheio de coisas, tão lotado de pessoas com pouco espaço para sentimento, com pouco tempo para ouvir e escutar.  
Tudo bem? Como anda seu coração? O que tem sentido?
Fale-me de nossa amizade, de sua família, de seu cachorro. Você tem cachorro?
Preciso ouvir você. Ou será você que necessita tanto falar?
Fale-me de você!




Imagem: pixabay.com


segunda-feira, 3 de julho de 2017

Escolher feijão, uma tarefa instrutiva

Quem já teve o prazer de "escolher" feijão ou, pelo menos, viu alguém a desempenhar tal tarefa, pode entender aonde eu quero chegar. É uma terapia e tanto, é instrutivo, além de ser necessário, claro.

Cada um tem sua forma de fazê-lo. Geralmente colocam-se os grãos sobre uma superfície plana, uma mesa, talvez, e vai puxando aos poucos. Aqueles que não prestam, de forma alguma - os podres, os corroídos, as pedras e afins - são separados num monte à parte para serem descartados. A vasilha, a gente deixa no colo para, quando escolhidos, serem nela depositados.

Dentre os que ficam, há alguns que nos dão a impressão de inutilidade por serem diferentes quanto à cor, tamanho, fragilidade e até mesmo pela aparência enrugada. Mas são bons. Farão a mesma função que todos. São feijões!


Tais quais são as nossas escolhas. É preciso separar aquilo que não presta, que pode nos fazer mal ou até mesmo tornar-se pedra no caminho. Mas muitos confundem: afastam-se do que é diferente, pelo simples fato de não possuírem as mesmas “medidas” consideradas normais por grande parte. Esquecem que não somos feitos a partir de um único molde, e que muitas circunstâncias podem trazer consigo detalhes que farão com que as diferenças germinem, e assim, cada vez mais, o que possuía uma forma única apresenta-se com diferentes rostos, tamanhos e cores e tantas outras.

Isto não é ruim. É enriquecedor e nos ajuda a abrir os olhos para os mais diversos horizontes, afinal, somos seres dinâmicos, não formatados. A beleza da vida está em abrirmo-nos às possibilidades, nunca em nos fechar dentro de um casulo e não querer enxergar que a transformação pode acontecer com o nascer das asas.

Separemos os feijões. À parte ficarão os que não prestam, não por suas alterações, mas porque já estão podres ou são simplesmente detritos. Mas aqueles que têm características diferentes, deixemos. São feijões e não deixam de sê-los. O tempero e o acompanhamento é que darão o toque final. E... no momento certo (ou não), todos irão para a mesma vasilha.


domingo, 18 de junho de 2017

Olhares...

Eu gosto do olhar!

Eu gosto da verdade que os olhos revelam.

Eu gosto dos olhos...

Eu gosto do levantar das sobrancelhas quando o encontro é surpreendente e inesperado.

Eu gosto dos cílios carregados de restos de lágrimas que, por tantos motivos, trazem uma história alegre ou triste...

Eu gosto do olhar!

Apaixono-me pelos olhos que se direcionam ao mais necessitado, ao que carece de atenção e amor e carinho, e abraço.

Gosto dos olhos que se voltam para o Criador, que reconhecem a presença de um Outro que se fez humano e que se aproxima e se deleita com aquilo que nos é tão particular e mais humano ainda...

Eu gosto do olhar quando carrega um segredo e sabe nos deixar curiosos.

Eu gosto dos olhos que transmitem paz, que me deixam seguro ao dizer, sem a necessidade de pronunciar: “Confie em mim! Segure minha mão e caminhe comigo”.

Apaixono-me pelo olhar tímido que, lentamente, acaba por se mostrar o mais acolhedor e se derrama em sentimento puro.

Eu gosto dos olhos da criança a pedir para brincar e se atirar na lama juntos, daquela que acompanha um contar de histórias movendo os olhos para cada acontecimento.

Eu gosto do olhar profundo, mas que se apresenta na simplicidade, e do olhar que arrebata e exala o mais intenso brilho, a mais estranha e desejável paixão.

Eu gosto dos olhos, apaixono-me pelo olhar...





Imagem: pixabay.com

quinta-feira, 15 de junho de 2017

Aproximar-se

Numa de minhas viagens para o interior de Minas, lugar onde meus pais moram e, claro, onde nasci, fiquei a observar algumas casas, dessas que ficam em meio a árvores, e distantes, lá no pé da montanha. Foi fácil imaginar o jeito gostoso de como deve ser a vida ali, naquele canto aparentemente de paz. Isso mesmo, aparente, pois uma de nossas manias é pensar que a beleza do lugar, visto de longe, livra-o de ter seus problemas típicos.
Demoramos para entender que contratempos e dificuldades existem em qualquer lugar, que ali a vida pode ser dura, afinal as muitas facilidades de quem vive numa zona urbana, não encontramos lá no pé da Serra ou no meio do Cerrado. A recíproca é também verdadeira.

É preciso aproximar-se para conhecer, para ver de perto e até mesmo fazer a experiência com quem está distante. Pode ser que tenhamos boas surpresas, mas pode também não ser. Tal qual o drama do palhaço que, por fora transborda de alegria, mas é capaz de esconder uma dor interna, incompatível com os montões de cores e acessórios que o fazem engraçado.
Olhar tudo desde a comodidade do nosso lugar e tecer apontamentos que julgamos certos pode ser perigoso.
É necessário que nos aproximemos; que deixemos de analisar as coisas e as pessoas a partir daquilo que, para mim ou para o meu grupo seleto, é bom ou ruim.
A beleza pode vir da paisagem, mas a realidade está além. Aproxime-se e entenda!




Imagem: http://blog.chicomaia.com.br/wordpress/wp-content/uploads/2012/12/118.jpg